Memória LiV
Cinema
Não à toa, Anthony Hopkins é considerado o ator mais completo (e complexo) dentre seus pares em Hollywood. Ostentando a mesma tranquilidade com a qual interpretou Nixon no cinema, Hopkins encarnou – anos depois – o genial (e genioso) artista Pablo Picasso. O ano era 1996 e Hopkins deixou plateias do mundo inteiro boquiabertas pela semelhança com o pintor espanhol.
Aos 80 anos, com um Oscar (por sua atuação em “O Silêncio dos Inocentes”), Hopkins conserva uma inquietude impressionante: acaba de estrear a série Rei Lear (o clássico de William Shakespeare ganhou uma nova adaptação, desta feita para a TV, em uma série produzida pela BBC e Amazon) e, desde 2003, por sugestão da esposa, Estella, ele exercita o talento para a pintura. “Ela encontrou uns desenhos... rabiscos mesmo e me perguntou ‘foi você quem fez isso?’, ao que respondi que sim. ‘Você deveria pintá-los’. E foi como tudo começou”. Hoje, passados quase 15 anos desde sua imersão no universo da pintura, ele mantém, em Los Angeles, uma galeria com uma exposição permanente de seus trabalhos. O produtor de cinema Aaron Tucker, amigo, também tem trabalhos expostos, dividindo o espaço com Sir Hopkins, na Margam Fine Art,
Com traços expressionistas, os trabalhos estão ao alcance do público que desejar ter uma obra de Sir Hopkins em casa. Em entrevista à W Magazine, Hopkins declarou que a “pintura era um hobby que mantinha seu cérebro ativo e que o fazia rir”. Sobre a curiosidade que suas pinturas despertam no público, o ator se diverte: “Interessante!”. Morando há alguns anos nos Estados Unidos, sua rotina está quase toda ligada ao exercício criativo: segundo o próprio, ele amanhece ao piano, praticando partituras e entra em seu ateliê pelo menos “4 vezes por semana”. Tamanha dedicação foi intensificada nos últimos dois anos. “Ultimamente tenho pintado mais e só saio deste exercício se tiver algum trabalho [no cinema] ou se tiver algum trabalho ou reunião no exterior”.
Quando questionado sobre prováveis influências, Hopkins não pensa duas vezes. “Não, não tenho influências... quer dizer, gosto muito de Van Gogh e Picasso, mas não ao ponto de ser influenciado por ambos. Sei que Picasso pintava muito nervosamente [rapidamente]; ele era um desenhista, que vendia. De qualquer forma, era um gênio!”
Tímido, se você perguntar a Anthony Hopkins o significado de uma pintura ou desenho em particular, a resposta poderá surpreendê-lo. “Eu não acho que haja algum significado nisso. Eu apenas crio. Vou pintando e não analiso, eu só vou para isso”. Em seu estúdio, tomado de tintas, óleos, acrílicos, garrafas de têmpera, canetas, marcadores, pincéis e telas, tudo converge para uma mistura de cores e possibilidades. “Estranhamente, mesmo com pinturas de todos os tamanhos nas paredes, o estúdio consegue expor um caos organizado”, ele afirma em seu site.
Hopkins define sua faceta como artista plástico como uma loucura. “Tudo é loucura total. É um reflexo do que está em minha mente. Eu digo aos mais jovens para serem isso: loucos! E que aproveitem, porque é da loucura que somos feitos. É do que eu sou feito”.
Nas telas, paisagens são retratadas, bem como pessoas. A predileção por rostos, entretanto, é flagrante. Em comum, em todos os retratos, olhos expressivos, poderosos e com muita vibração. “O rosto não é importante. São os olhos que são a parte mais assombrosa da alma de alguém. É muito primitivo. É uma arte infantil. Tem que ser infantil porque eu sou criança. Eu descobri ultimamente que gosto de tudo que é supostamente errado comigo. Eu costumava me levar tão a sério, mas agora eu não. Eu me permito me divertir na natureza emocionante da vida”.
Muito justo, afinal de criança e de loucos, todos temos um pouco.