Com traços fortes, que delineiam rostos de mulheres vigorosas, o artista visual Negritoo, de São Paulo, homenageia o universo feminino em que fora criado. “Meus pais se separaram e eu cresci rodeado por mulheres. Minha mãe trabalhava o dia inteiro e eu ficava com minha avó e tias. Sempre encontrei mulheres com personalidade forte e independentes”, revela. Ele é um dos artistas que estão despontando na cena contemporânea brasileira e se prepara para participar em dezembro do Art Basel, uma das mais conhecidas e maiores feiras de arte em Miami.
A arte urbana, como referência, salta aos olhos. Dentre outras influências, Negritoo traz, em suas obras, o colorido do grafite. Das histórias em quadrinhos, a ideia das personagens – em suas memórias ainda constam os famosos da Hanna Barbera e o famoso Pica-Pau. Já o movimento vem das inspirações nas obras do pintor tcheco Alphonse Mucha, ícone do art-nouveau e que também pintava mulheres em suas melhores formas. Walney Martins (nome de registro de Negritoo) acredita que, imerso nesse liquidificador de arte, ainda tem um vasto caminho de descobertas pela frente.
“No começo eu costumava deixar os desenhos somente em preto e branco e aos poucos fui acrescentando as cores. Vi que era algo alegre e gostei dessa sensação. As pessoas se sentiam alegres também, com essa ideia do trabalho ser mais colorido. Sinto que isso tudo ainda está em processo; percebo mutações no meu trabalho, como algo que ainda está se moldando. Mas acredito que cheguei num resultado que estou gostando bastante”, afirma, acrescentando que é normal de todo artista revisar sua carreira.
Nesse período de testes e experimentações, ele também tem feito trabalhos em outros suportes: telas, muros, paredes… mas também madeiras e, até mesmo, bases de skate. Da mesma forma que varia com osmateriais, o artista alterna entre spray, lápis, tintas e a pintura digital. Ele conta que sempre gostou de experimentar, fazer coisas novas para “sair da zona de conforto”, misturando suas ideias com os detalhes de obras de artistas que ele admira. “Vejo meus trabalhos antigos e o quanto eles mudaram. Então, sei que daqui a um ano, a minha forma de desenhar e pintar também vai ser diferente, estou sempre tentando testar coisas novas para expressar minha arte”, conta.
“Gosto de ir variando os suportes para experimentar, mesmo com os shapes quebrados dos skates, que normalmente vão pro lixo, pra mim servem como tela, superfície – da mesma forma como faço grafite no muro. Não quero ficar só na parede ou no papel. Gosto de mudar para ver os efeitos e as transformações dos objetos”, diz.
O começo
Para Negritoo, a arte surgiu naturalmente em sua vida. Ele lembra que, ainda criança, quando tinha entre 3 e 4 anos, já adorava desenhar os super heróis que via na TV. Quando decidiu falar para a mãe que queria ser artista, veio a preocupação com o sucesso na carreira e o desejo mesmo era que ele seguisse por profissões como médico ou advogado. “Mas nunca tive o menor dom para isso”, admite o artista, que após terminar o ensino fundamental, foi estudar na escola técnica Carlos de Campos, onde passou quatro anos aprendendo sobre arte.
“Era como se fosse uma faculdade! Aprendi gravura, pintura, história da arte e isso abriu minha mente. Foi quando tive certeza que queria trabalhar como artista. Formado na escola técnica, fui para a Mackenzie fazer o curso de desenho industrial. Iniciei nos estágios como designer gráfico e, desde então, trabalho como designer e ilustrador”, conta. E no meio das demandas, o que era apenas um hobby - desenhar sem o compromisso de entregar aos clientes – acabou se tornando a sua expressão autoral, o que foi ganhando peso ao longo dos anos, com os rostos femininos.
Ele gosta de definir como “rostos expressivos, mas que carregam também melancolia e mistério”. “Gosto de passar esses sentimentos. Às vezes vejo no Instagram um rosto interessante e fico rabiscando, buscando algo entre a força e a delicadeza”, diz, sugerindo que agora é só o começo. “Agora que estou começando a entrar nesse circuito de mostras. Tem pouco mais de um ano e meio que meu trabalho autoral tem aparecido”, comenta.
Um dos seus objetivos, para os próximos anos, é realizar mais expiações e uma mostra individual. Por enquanto, ele se conecta com o público de forma virtual, por meio do Instagram, rede social que também tem sido uma vitrine para venda de trabalhos e para networking. Para os próximos meses, ele está pesquisando uma maneira de inserir nos desenhos um volume, por meio de MDF. “Já fiz umas três peças, são desenhos que mando recortar em madeira e viram 3D. Tenho realizado aos poucos e estou achando legal, um resultado bem interessante”, adianta.