Swami Antar Rohit nasceu em Los Angeles, em 1960, e mudou-se para Belém aos cinco anos de idade. O nome verdadeiro era Thomas Lee Mahon – que foi modificado anos depois. Desde muito cedo, teve contato com uma capacidade criativa ainda latente na infância: em casa, o incentivo vinha da mãe, Dona Élida. E o filho correspondia – tudo o que via, queria aprender a fazer. Fazia e vendia. Assim, entre infância e adolescência, Antar Rohit fez pulseiras com arame, bijuterias, talha de madeira, gravação de metal com ácido, bolsinhas de couro, velas, tintura de amarrar até chegar ao Batik, aos 16 anos, uma técnica de tingimento de tecidos com cera e pigmentos.
A irmã, Laura Calhoun, lembra que na casa sempre havia espaço para criar, uma área onde podiam colar, recortar, pregar, queimar, pintar e experimentar. E a bagunça podia ficar por dias, contanto que não se espalhasse pelos outros cômodos.
A Casa tinha espaço, suporte e incentivo também, com ferramentas e materiais. “Em casa, tínhamos muita liberdade, mas com responsabilidade. Nossa mãe acreditava em nós e apoiava, dava força sempre que precisávamos. Ela comprava muito material de artes e nós pagávamos o que ela gastava, depois: vendendo o que produzíamos”, recorda Laura Calhoun. “Na escola que ele estudou havia muita aula de arte naquela época. Lembro que o Rohit pintou uma aquarela da nossa casa e ganhou um prêmio no colégio. São essas pequenas vitórias que ajudam a acreditar em você mesmo”.
E foi na pintura que o artista encontrou uma outra forma de recriar a realidade em que vivia. Coerente com o ser curioso que era, Antar Rohit não se contentou em fazer uma pintura tradicional.
A aprovação no vestibular, que veio por duas vezes (primeiro no curso de Administração, depois em Comunicação) não resultou em uma formação acadêmica. Os cursos foram logo abandonados em troca de um emprego numa plataforma de petróleo, como intérprete, com a complementação da pintura, nos dias de folga. Aos 19 anos, fez a primeira exposição individual na Galeria Ângelus, do Teatro da Paz, quando já apresentou trabalhos em Pintura sobre Seda, técnica que o artista viria a desenvolver durante toda sua carreira. “Cheguei a brincar com acrílica, com óleo, com pastel, com aquarela, mas nenhuma técnica eu me apaixonei. E até hoje eu penso, antes de começar uma exposição, que vou fazer alguma coisa com acrílica e tela, mas, sempre volto para a seda”, dizia o próprio Antar Rohit ao falar de sua arte.
Com a venda dos quadros e os salários guardados, embarcou para a América para estudar teatro, outra paixão.
Das tintas para os palcos
Das experiências com marionetes e peças escolares na infância às montagens de teatro profissional, o artista aprendeu a ser seu próprio instrumento, a usar o corpo e a voz como matéria-prima que precisam ser trabalhados, assim como as emoções e pensamentos, numa espécie de catarse semelhante à meditação que mais tarde viria surgir em sua vida. “Nós todos somos multifacetados, e o Rohit não era diferente”, explica Laura Calhoun. “Para ser total, ele precisava realizar tudo: a pintura, o teatro, um pouco de cinema, o ser espiritual, a meditação e terapia o movimento de crescer, o realizador empresarial. Ao mesmo tempo eram atividades independentes. Meu irmão não tirava férias, ele estava sempre produzindo algo”, conta Laura.
A inquietação, marca registrada da personalidade de Antar Rohit, trouxe o artista de volta ao Brasil, para Belém, que passaria a ser uma referência, um porto seguro entre as idas e vindas pelo mundo. A mãe havia falecido durante o período em que ele estava nos EUA. A relação com o mundo já tinha mudado, mas o foco continuava sendo a arte.
Aqui, foi morar com dois amigos em uma ilha, onde pintava diariamente para mais uma exposição, e novamente, uma mudança. Com o dinheiro da venda dos quadros, Rohit foi morar no Rio de Janeiro. Foram quatro anos de dedicação ao teatro.
Em 1983, em um dos retornos a Belém, encontrou a cidade envolvida com a produção do filme “Floresta das Esmeraldas” de John Boorman. Foi a primeira experiência em cinema, mas continuava pintando. Ao final das filmagens, mais uma exposição com as obras produzidas no período e mais uma viagem. Desta vez, para conhecer a filosofia do mestre Osho, no Festival Anual da comunidade no Oregon - USA. Anos depois, Antar Rohit também estrelou o filme “Corpos Celestes”, produzido no Paraná.
Em busca do autoconhecimento
As novas descobertas sobre a filosofia de Osho deslumbravam o artista, então com apenas 23 anos. Para ser discípulo do mestre Osho eram necessárias quatro coisas: mudar de nome, usar o mala, usar as cores do sol nascente e meditar uma hora por dia.
Ele estava ensaiando um novo espetáculo teatral no Rio de Janeiro quando recebeu uma carta da Índia dizendo: “seu novo nome é Swami Antar Rohit, Antar significa interiore Rohit, sol nascente” - Sol Nascente do Interior. Foi a última peça como ator profissional no Rio de Janeiro. O teatro havia cedido lugar de destaque para o autoconhecimento e a meditação, que se refletiam também em sua pintura de cores fluidas.
Os próximos 10 anos marcaram um período de constantes mudanças, investigações, experimentações, riscos, descobertas e transformações. Esta trajetória passou por vários continentes, tendo Belém como ponto de referência onde vinha processar as mudanças e estar com a família.
Nesta busca incessante pelo conhecimento interior, Antar Rohit foi para o Havaí, e novamente, a pintura se impôs. Sem trabalho, pintava e os quadros interessaram a Stones Gallery – Kauai Hawaii, galeria que expôs as obras e tornaram o artista reconhecido. Do Havaí, voltou a Los Angeles, nos EUA, em 1987, onde participou de um grande salão de Artes Plásticas em Laguna Beach.
Em 1987, foi morar na Índia, onde conheceu várias comunidades filosóficas, até chegar na Holanda para estudar na Human University Psicology - a Humanversity. Rohit se tornou doutor e a carreira de terapeuta passou a fazer parte das inúmeras atividades do artista.
Empreendedorismo nas artes
A volta definitiva para Belém foi em 1993. Conciliando as atividades de terapeuta com a pintura, Antar Rohit conquistou o mercado empresarial. Cultivava contatos que quase sempre se tornavam patrocinadores de seus projetos. “O setor empresarial de Belém deu muita força ao trabalho do meu irmão, além de patrocinar projetos, compravam os quadros, davam suas obras como presentes aos clientes, e assim criavam um lindo movimento circular com a arte”, avalia Laura Calhoun.
A visão empreendedora também resultou na sociedade com Ely Ribeiro. Juntos, abriram uma loja em 2005, a Amazônia Zen, com uma proposta inovadora na época. A comercialização de camisas com ilustrações das obras de arte criadas por Rohit. Sempre retratando elementos simbólicos de Belém e pontos turísticos do patrimônio histórico da cidade. “A casa dele era o nosso ponto de encontro para decidir o lado criativo da sociedade”, lembra Ely Ribeiro. “Rohit cuidava do lado criativo, das ideias inovadoras, e me apoiava nas decisões administrativas. Nós tínhamos muita facilidade de relação, deixou muitas saudades”, diz Ely.
O artista plástico Simões conheceu Antar Rohit desde jovem e destaca a capacidade de empreendedor do amigo. “Ele tinha um modo de fazer as coisas com um estilo próprio, se dedicava à arte e também a outros projetos”, lembra. “Ele conseguia ir atrás de mercado, era uma pessoa de realizações, com um pique muito grande de trabalho, tinha muita disposição”, ressalta Simões.
Paraense em movimento
Para Roseane Nogueira, que foi produtora das exposições de Antar Rohit e parceira nos projetos na área terapêutica durante 30 anos de amizade, ele era um apaixonado por Belém, por isso, pintava a cidade.
Com ela, Antar Rohit criou, em 1997, o Criar - Programa de Desenvolvimento da Expressão Criativa, que proporcionava treinamento em Criatividade que se estendeu, renovou e acabou se transformando num projeto de Crescimento Pessoal e que deu origem à Osho Multiversity Criar, em Belém, que aliava todo o conhecimento filosófico adquirido, ao amor pela cidade, expresso em forma de arte.
São poucos os artistas plásticos que, na sua arte de pintar Belém, conseguiram criar uma identidade tão forte com a cidade antiga, os bairros históricos, casarios, catedrais e elementos simbólicos tão marcantes. Rohit soube inventar a imagem de um lugar que todos viveram de alguma forma, um lugar que ele sonhava sem as marcas da modernização, demarcando os lugares poéticos da cidade em seus 400 anos de história e preservá-la. “Eu sempre tive um sonho, de um dia, quando ficasse velhinho, fazer um trabalho que retratasse Belém de uma maneira mais ampla, o seu patrimônio, a sua arquitetura”, dizia o próprio Rohit, quando desenvolveu o projeto Amorocidade, de 1995 a 1999. “Senti que tinha cumprido uma meta, uma missão com a cidade”, declarou no vídeo de divulgação do projeto.
A partir daí, o artista expandiu o trabalho e passou a retratar a Amazônia, onde Belém estava inserida. Os elementos da Amazônia, como a folha, a canoa, os pássaros e peixes, eram retratados de uma maneira simbólica, que representam o sentimento do artista do que é a Amazônia, mas como emblemas.
“A região e a cidade de Belém têm um movimento, único, forte, independente de expressão artística, que é diferente do resto do Brasil. Isso inspirava Rohit e dava a ele uma identidade maravilhosa com a região amazônica, de ser paraense, belenense”, afirma a irmã, Laura.
Antar Rohit deixou este plano em novembro de 2007, quando morava em Porto Alegre, vítima de câncer. Quase um ano após sua morte, foi fundada em Belém a Casa Antar Rohit, no mesmo lugar onde ele morava. No espaço cultural, ficavam expostas suas obras mais significativas com o objetivo de despertar o público para as práticas artísticas e de autoconhecimento através de cursos e oficinas. “Era uma proposta excelente, unia terapia, meditação e arte, que eram as coisas mais importantes para meu irmão.”, explica Laura Calhoun.
Apesar dos esforços, a casa foi vendida um ano depois para uma amiga da família que ainda preserva várias obras de Antar Rohit. Outras obras do acervo dele foram doadas ao Museu da UFPA.
Mas Laura Calhoun acredita que o irmão tenha deixado um legado para o cenário artístico de Belém e do Brasil. “Em seu caminho, ele retratou a cidade de Belém com um olhar muito amoroso. A gente se criou em uma casa antiga e aquela casa, o piso, as janelas, a cama dele são imagens recorrentes em sua obra. Acho que um grande legado dele é o mergulho intenso no trabalho, com foco. Não era apenas pintar, representar ou outras atividades. Rohit demonstrava o que tinha dentro dele, um plano. Ele sempre tinha um projeto de curto e longo alcance. E fazia tudo usando todas as suas qualidades, para demonstrar o que sentia e o que tinha para dividir com o mundo. Ele foi muito cedo, mas sonhou e realizou muito, deixou muitas saudades. Às vezes eu faço algo ou realizo um projeto e penso: ‘isso é pra você, mano! Você ficaria orgulhoso de mim’. Isso ajuda a amenizar a dor da perda”, conclui Laura.