Uma jóia de cidade que muitos viajantes subestimam é Antuérpia. Talvez por estar entre Bruxelas, na Bélgica, e Amsterdam, nos Países Baixos - dois grandes pólos turísticos na Europa. A segunda maior cidade belga tem cerca de 500 mil habitantes e é uma espécie de capital cultural de Flandres, parte norte da Bélgica, onde 60% das pessoas falam neerlandês. A cidade reúne história e contemporaneidade, importância econômica e cultural. E tem ares de metrópole no sentido mais cosmopolita da palavra: são pelo menos 170 diferentes nacionalidades e mais de 300 idiomas.
Uma visita à Antuérpia merece ser feita em, pelo menos, 3 dias. Mas o que essa cidade tem que justifique uma estadia mais longa? Bem, tem tanta coisa que o melhor é dividir essa reportagem em duas. Primeiro, um pouco de história e os highlights do passado. E depois, a Antuérpia de hoje, considerada um dos berços mundiais da vanguarda da moda atual.
O porto: a cidade e o mundo, o passado e o futuro.
Antuérpia ganhou ares de cidade na Idade Média, mas foi na Idade Moderna, na metade do século XV, que se tornou centro comercial mundial do norte da Europa. O porto cresceu devido ao declínio da cidade de Bruges e justamente no momento das grandes navegações.
Flandres fazia parte dos Países Baixos sob governo espanhol, não por invasão, mas por herança: o imperador Carlos V era flamengo de nascimento e neto dos reis católicos Fernando de Aragão e Isabel de Castilla, e de Maria da Borgonha, condessa de Flandres, e de Maximiliano da Áustria. Dos avós espanhóis, Carlos V herdou as colônias americanas, recém descobertas. Graças a esse vasto império, o mundo chegou ao porto à beira do rio Escalda que desemboca no mar do Norte. No século XVI, 40% de todo o comércio mundial passava pela Antuérpia. E, até hoje, a metrópole flamenga possui o segundo maior porto da Europa.
Para completar a grande virada econômica da cidade no século XVI, os comerciantes internacionais trocaram Bruges pela Antuérpia. A bolsa de valores ganhou importância na Antuérpia que passou a negociar papéis e outras matérias-primas. Foi nesse período que as primeiras oficinas de lapidação de diamantes mudaram para cá. Essa pedra trazida da Índia pelos navegadores se firmou como produto local. Até hoje, a metrópole flamenga é a capital mundial do diamante: 86% dos diamantes brutos e 50% dos diamantes lapidados comercializados no mundo passam por Antuérpia, onde existe o Museu para o Diamante, Joias e Prata - DIVA. Para saber tudo sobre a mais valiosa pedra do mundo acesse: https://www.divaantwerp.be/en/
Um lugar que sintetiza a longa história portuária da Antuérpia, com toda a contemporaneidade da arquitetura do século XXI, é o MAS (Museum aan het Stroom), que completou 20 anos. O museu ocupa 10 andares, 5.700 m² de exposições e 500 mil peças em acervo. E vale a visita. O prédio tem paredões de vidro e um terraço com uma das vistas mais bonitas do porto e da cidade. E o melhor: acesso gratuito a essa parte do prédio, assim como ao simpático café no térreo.
Não muito longe do MAS, um outro museu se concentra num dos maiores capítulos da história da migração humana, a dos europeus que partiram para o Novo Mundo. São rostos famosos ou anônimos que passaram pelo porto de Antuérpia entre 1873 e 1935, nos antigos galpões da companhia de navios de passageiros, Red Star Lines. O complexo virou um museu que conta a história dessa emigração da Europa rumo às Américas. A exposição permanente reconstitui o ambiente dos navios e revela o rigoroso controle sanitário para uma nova vida do outro lado do Atlântico. Há fotos, áudios e vídeos das tripulações e de emigrantes como o cientista Albert Einstein, que mudou para a Califórnia em 1930, ou ainda Golda Meir, fundadora do estado de Israel e primeira-ministra israelense, cuja família emigrou da Rússia para os EUA em 1906, e o compositor Irving Berlin que fugiu, com a família, em 1896, da Bielo-Rússia e se tornou um dos maiores compositores da Broadway nos anos 1940, com canções como Cheek to Cheek e White Christmas.
É também na área do porto que passado e presente se interligam numa das últimas obras da arquiteta anglo-iraniana Zaha Hadid, falecida em 2016: a sede da capitania do porto de Antuérpia (Huis van de Haven). O antigo prédio ganhou um anexo em vidro e metal. O website da Zaha Hadid Architects ( https://www.zaha-hadid.com/architecture/port-house/) apresenta melhor essa obra ousada que resume o espírito futurista de Antuérpia fortemente ancorado no passado.
A mão da lenda e a mão do barroco, Rubens
Tanta riqueza da chamada Era Dourada deixou suas marcas na cidade que tem um centro histórico de traçado medieval com a maior e mais alta igreja gótica dos Países Baixos, a catedral de Nossa Amada Senhora. Mas, também, uma centena de monumentos renascentistas e barrocos. A sede da prefeitura é um dos maiores exemplos do barroco no norte da Europa.
Na grande praça em frente à prefeitura, um chafariz reconstitui a lenda em torno do nome da cidade. Antwerpen, em neerlandês, seria derivado de hand werpen (jogar a mão): um gigante exigia pagamento dos navegadores vindos do mar do Norte para deixá-los entrar na cidade. Se não pagassem, tinham a embarcação destruída. Um dia, um herói luta contra o gigante, corta a mão dele e a joga no rio, liberando o livre acesso à cidade.
Outra referência a essa lenda é a escultura na área do antigo porto, em frente ao Het Steen, a mais antiga construção da Antuérpia. Um complexo que fazia parte da muralha medieval de proteção da cidade. A escultura mostra o lendário gigante Lange Wapper que cobrava pela entrada à cidade. Hoje a antiga porta serve de centro de visitantes, como parte do terminal de recepção dos passageiros dos navios de cruzeiros.
Se há um nome ligado à corrente artística do Barroco nas artes visuais, só pode ser o de Peter Paul Rubens (1577-1640), que fez carreira e fama na Antuérpia do século XVII e se tornou a mão do Barroco no norte europeu. A casa e o atelier dele foram preservados e viraram um museu. Mas, se quiser ver uma obra do artista, sem entrar num museu, vá à catedral onde a imensa pintura A Descida da Cruz (1614) está num dos altares.
Santuário do livro e a catedral da era industrial
Antuérpia tem também o privilégio de ser a cidade de Plantin-Moretus, uma espécie de santuário dos livros. A imponente mansão abriga a única gráfica e editora equipadas do século XVI. Com mais de 400 anos, é o único museu no mundo considerado pela Unesco Patrimônio Histórico da Humanidade. E não é para menos. Na coleção há raridades como os globos terrestres e os primeiros atlas com a América recém-descoberta, assim como as primeiras edições da Bíblia.
Se o mundo passava pelo porto de Antuérpia a partir do século XV, no século XIX outro meio de transporte trouxe o mundo por terra até a beira do rio Escalda. A Bélgica foi o segundo país a ter uma rede ferroviária, e logo Antuérpia ganhou uma estação considerada hoje a mais bela do mundo.
Mas, para fazer jus à cidade, foi erguida a catedral da ferrovia, com mais de 40 metros de altura. A construção reúne vários estilos arquitetônicos usando a tecnologia industrial do ferro.
Dicas:
Chegar: Antuérpia fica a 45 minutos de trem de Bruxelas e a 2 horas de Amsterdam.
Transporte: ônibus, bonde ou metrô. A pé, são menos de 30 minutos da estação central ao centro histórico. Para o porto, dá pra ir de bicicleta. O Visit Antwerpen traz roteiros de bicicleta:
https://www.visitantwerpen.be/en/transport-antwerp/antwerp-by-bike-en
Onde ficar: As opções são várias e para todos. Sugestões no
Visit Antwerpen: https://www.visitantwerpen.be/en/spending-the-night-in-antwerp
Onde comer: A culinária é mundial e é obrigatório degustar a cerveja. Dicas n Visit Antwerpen: https://www.visitantwerpen.be/nl/eten-drinken/bier-antwerpen